Enquadramento Legal da Intervenção das Entidades com Competência em Matéria de Infância e Juventude

30-07-2014 11:00
A Lei de Protecção de Crianças e Jovens em Perigo (LPCJP) é bem clara quando define as modalidade de intervenção na protecção da criança e do jovem em situação de risco. De acordo com o expresso no artigo 6º da LPCJP, “A promoção dos direitos e a protecção da criança e do jovem em perigo incumbe às entidades com competência em matéria de infância e juventude, às comissões de protecção de crianças e jovens e aos tribunais.”
Respeitando a Lei e fazendo uma gestão rigorosa dos recursos de cada comunidade, compete às referidas entidades[1] actuar em primeiro lugar, intervindo de modo consensual com os pais, representantes legais ou com quem tenha a guarda de facto da criança ou do jovem (artigo 7º da mesma Lei). “A intervenção das comissões de protecção de crianças e jovens tem lugar quando não seja possível às entidades referidas no artigo anterior actuar de forma adequada e suficiente a remover o perigo em que se encontram” as crianças, artigo 8º da LPCJP.
 
“ A intervenção no risco é sempre da competência das Entidades com Competências em Matéria de Infância e Juventude, não tendo as CPCJ legitimidade para intervir nestas situações.
A Intervenção no perigo deve ser iniciada pelas Entidades referidas, transitando para a CPCJ apenas quando não seja possível às mesmas actuar de forma suficiente para remover o perigo”[2]
 
Sendo os recursos da comunidade tão escassos como sabemos, esta gestão ter-se-á que fazer de modo adequado. A Lei 147/99 de 1 de Setembro, conforme afirma Borges[3] (2007; 62) “visou regulamentar essa intervenção social do Estado e da Sociedade nas situações em que a criança/jovem se encontra em perigo, e, como tal, carecida de protecção. Trata-se de uma intervenção subsidiaria (a do Estado), em relação à intervenção da comunidade, tendo em conta, em primeiro lugar, as entidades (da sociedade ou comunidade), com competência em matéria de infância/ juventude)”. Deverá ser a comunidade em colaboração com a família a proteger a criança. Esta colaboração será privilegiada pela proximidade e sensibilidade para com a criança, família e o meio onde está inserida. O Estado ao intervir irá com certeza interferir “com a liberdade e autodeterminação da criança e do jovem e com o papel que cabe aos pais, quanto à manutenção e educação dos seus filhos” Borges, (2007:63).
 
Existindo uma articulação entre todos os agentes sociais da comunidade (escolas, hospitais, creches, câmaras municipais, juntas de freguesia, serviços de segurança social) a detecção das situações de risco será feita de um modo muito mais eficiente e o encaminhamento para as ENTIDADES que podem assegurar os direitos e a protecção da criança, mais rápido.
 
Na impossibilidade das ENTIDADES darem a resposta adequada e suficiente à remoção da situação de risco, a mesma deve ser, e apenas nestas situações, participada e comunicada às comissões de protecção, explicitando o motivo que levou à intervenção, o que foi feito e o que não resultou, de modo a facilitar a intervenção da CPCJ.
 
A intervenção das ENTIDADES, deve acontecer nas situações previstas no artigo 3º da LPCJP, ou seja:
1 — A intervenção para promoção dos direitos e protecção da criança e do jovem em perigo tem lugar quando os pais, o representante legal ou quem tenha a guarda de facto ponham em perigo a sua segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento, ou quando esse perigo resulte de acção ou omissão de terceiros ou da própria criança ou do jovem a que aqueles não se oponham de modo adequado a removê-lo.
2 — Considera-se que a criança ou o jovem está em perigo quando, designadamente, se encontra numa das seguintes situações:
a) Está abandonada ou vive entregue a si própria;
b) Sofre maus tratos físicos ou psíquicos ou é vítima de abusos sexuais;
c) Não recebe os cuidados ou a afeição adequados à sua idade e situação pessoal;
d) É obrigada a actividades ou trabalhos excessivos ou inadequados à sua idade, dignidade e situação pessoal ou prejudiciais à sua formação ou desenvolvimento;
e) Está sujeita, de forma directa ou indirecta, a comportamentos que afectem gravemente a sua segurança ou o seu equilíbrio emocional;
f) Assume comportamentos ou se entrega a actividades ou consumos que afectem gravemente a sua saúde, segurança, formação, educação ou desenvolvimento sem que os pais, o representante legal ou quem tenha a guarda de facto se lhes oponham de modo adequado a remover essa situação.
 
Nota: O conceito de risco e perigo distinguem-se pelo grau de gravidade para a efectivação dos direitos da criança. Ou seja, o RISCO implica um perigo apenas potencial ou eventual. PERIGO decorre de uma situação que afecta a segurança, saúde, formação, educação ou desenvolvimento integral da criança de um modo muito provável, embora não traduzido em efectivo dano, como o caso das situações a cima descritas.
 
 
As Entidades podem intervir APENAS com o consenso dos responsáveis parentais e a não oposição do jovem com mais de 12 anos, ou menos de 12 desde que tenha capacidade para compreender o sentido da intervenção. É fundamental “ouvir a criança, os seus representantes, de procurar que os pais assumam os seus deveres para com o filho e designadamente de não estar em curso outra intervenção de outra entidade com competência em matéria de infância em juventude” Borges, (2007:66). Sem estes pressupostos, as Entidades não podem intervir.
 
 
Em suma,
“A intervenção no risco é sempre da competência das Entidades com Competência em Matéria de Infância e Juventude, não tendo as CPCJ legitimidade para intervir nestas situações.
A intervenção no perigo deve ser iniciada pelas Entidades referidas, transitando para a CPCJ apenas quando não seja possível às mesmas actuar de forma suficiente para remover o perigo.
 
Estas Entidades devem actuar de modo articulado, seguindo os seguintes procedimentos:
  • Efectuar estudo sumário da situação, onde se pretende esclarecer os factos que estão na origem da sinalização;
  • Avaliar o grau de risco ou de perigo em que se encontra, avaliando igualmente o bem-estar da criança ou jovem e a salvaguarda dos seus direitos;
  • Agir de modo consensual e com a adesão dos pais, representante legal ou quem tenha a guarda de facto, que devem ser informados da razão da intervenção, bem como da legitimidade de intervenção dos profissionais e do seu direito a aconselhamento legal;
  • Certificar-se da não oposição da criança ou do jovem com idade igual ou superior a 12 anos;
  • Assegurar o apoio e protecção que considerem mais adequado à criança ou jovem e sua família, compatível com as suas atribuições, devendo para tal ser elaborado um plano individual de acompanhamento/apoio à criança e família.[4]
 


[1]    Entidades — as pessoas singulares ou colectivas públicas, cooperativas, sociais ou privadas que, por desenvolverem actividades nas áreas da infância e juventude, têm legitimidade para intervir na promoção dos direitos e na protecção da criança e do jovem em perigo (alínea d) do artigo 5º LPCJP)
[2]    Todos somos responsáveis – Documento de Apoio para Promoção e Protecção dos Direitos de Criança e Jovens, CPCJ do Cartaxo 2007
[3]    BORGES, Beatriz Marques; Protecção de Crianças e Jovens em Perigo, Coimbra: Almedina, 2007
[4]    Todos somos responsáveis – Documento de Apoio para a Promoção e Protecção dos Direitos de Crianças e Jovens, Comissão de Protecção de Crianças e Jovens do Cartaxo (2007).

 

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